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E então, que quereis?...
Maiakóvski
Fiz ranger as folhas de jornal
abrindo-lhes as pálpebras piscantes.
E logo
de cada fronteira distante
subiu um cheiro de pólvora
perseguindo-me até em casa.
Nestes últimos vinte anos
nada de novo há
no rugir das tempestades.
Não estamos alegres,
é certo,
mas também por que razão
haveríamos de ficar tristes?
O mar da história
é agitado.
As ameaças
e as guerras
havemos de atravessá-las,
rompê-las ao meio,
cortando-as
como uma quilha corta
as ondas.
(1927)
Vladímir Maiakóvski nasceu e passou a infância na aldeia de Bagdádi,
nos arredores de Kutaíssi (hoje Maiakóvski), na Geórgia - Rússia. Lá cursou o
ginásio e, após a morte súbita do pai, a família ficou na miséria e transferiu-se
para Moscou, onde Vladímir continuou seus estudos. Fortemente impressionado pelo
movimento revolucionário russo e impregnado desde cedo de obras socialistas, ingressou
aos quinze anos na facção bolchevique do Partido Social-Democrático Operário Russo.
Detido em duas ocasiões, foi solto por falta de provas, mas em 1909-1910 passou onze
meses na prisão. Entrou na Escola de Belas Artes, onde se encontrou com David Burliuk,
que foi o grande incentivador de sua iniciação poética. Os dois amigos fizeram parte do
grupo fundador do assim chamado cubo-futurismo russo, ao lado de Khlébnikov, Kamiênski e
outros. Foram expulsos da Escola de Belas Artes. Procurando difundir suas concepções
artísticas, realizaram viagens pela Rússia. Após a Revolução de Outubro, todo o grupo
manifestou sua adesão ao novo regime. Durante a Guerra Civil, Maiakóvski se dedicou a
desenhos e legendas para cartazes de propaganda e, no início da consolidação do novo
Estado, exaltou campanhas sanitárias, fez publicidade de produtos diversos, etc. Fundou
em 1923 a revista LEF (de Liévi Front, Frente de Esquerda), que reuniu a esquerda
das artes, isto é, os escritores e artistas que pretendiam aliar a forma
revolucionária a um conteúdo de renovação social. Fez inúmeras viagens pelo país,
aparecendo diante de vastos auditórios para os quais lia os seus versos. Viajou também
pela Europa Ocidental, México e Estados Unidos. Entrou freqüentemente em choque com os
burocratas e com os que pretendiam reduzir a poesia a fórmulas
simplistas. Foi homem de grandes paixões, arrebatado e lírico, épico e satírico ao
mesmo tempo. Suicidou-se com um tiro em 1930. Sua obra, profundamente revolucionária na
forma e nas idéias que defendeu, apresenta-se coerente, original, veemente, una. A
linguagem que emprega é a do dia a dia, sem nenhuma consideração pela divisão em temas
e vocábulos poéticos e não-poéticos, a par de uma constante
elaboração, que vai desde a invenção vocabular até o inusitado arrojo das rimas. Ao
mesmo tempo, o gosto pelo desmesurado, o hiperbólico, alia-se em sua poesia à dimensão
crítico-satírica. Criou longos poemas e quadras e dísticos que se gravam na memória;
ensaios sobre a arte poética e artigos curtos de jornal; peças de forte sentido social e
rápidas cenas sobre assuntos do dia; roteiros de cinema arrojados e fantasiosos e breves
filmes de propaganda. Tem exercido influência profunda em todo o desenvolvimento da
poesia russa moderna. (Boris Schnaiderman in "Poesia Russa Moderna", Editora
Brasiliense, 1985).
Poema extraído do livro Maiakóvski Antologia Poética, Editora Max
Limonad, 1987, tradução de E. Carrera Guerra.
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